The giant anteater (Myrmecophaga tridactyla) is considered Vulnerable in Brazil. Information on its captive maintenance and reproduction is scarce, but may be of great importance for the conservation of this species. This article provides information on the management, diet, birth rates, survival rates, causes of newborn and juvenile death, and sexual maturity of captive giant anteaters from São Paulo Zoo, Brazil (FPZSP). The institution has maintained 77 giant anteaters between 1968, when the first individual was received, and June 2007. It registered the country's first captive birth and natural rearing of a giant anteater in 1986. All measures taken by the institution aim at increasing reproductive rates and offspring survival, thus making it a national reference in giant anteater breeding and maintenance and contributing to the conservation of this species.
Introdução
Todas as espécies da superordem Xenarthra possuem taxa metabólica e temperatura corporal mais baixas em relação a outros mamíferos de porte similar (Feldhamer et al., 1999), características relacionadas ao baixo valor energético de sua dieta especializada (Medri et al., 2006). Os membros da família Myrmecophagidae, ordem Pilosa, estão restritos a áreas tropicais e subtropicais do Novo Mundo (Emmons e Feer, 1997) e possuem algumas características peculiares, como a ausência de dentes. Esta família é composta por três espécies, sendo duas de ocorrência no Brasil: tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla Linnaeus, 1758) e tamanduá-mirim (Tamandua tetradactyla Linnaeus, 1758; Gardner, 2005).
A espécie Myrmecophaga tridactyla está inclusa na categoria vulnerável no Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção (Medri e Mourão, 2008). Dados de cativeiro de tamanduá-bandeira são escassos, sendo de grande importância para sua conservação quaisquer informações retiradas de observações in-situ e ex-situ. Este trabalho compila informações a respeito da biologia reprodutiva dos tamanduás-bandeira cativos da Fundação Parque Zoológico de São Paulo (FPZSP). Estes dados foram retirados das fichas de todos os indivíduos que foram mantidos pelo Setor de Mamíferos desta instituição, que recebeu seu primeiro indivíduo, uma fêmea, no ano de 1968.
Até o mês de junho de 2007, a instituição já manteve 77 exemplares, sendo 30 machos, 36 fêmeas e 11 de sexo não determinado. Em maio de 1986, na FPZSP houve o primeiro nascimento e criação natural em cativeiro de tamanduá-bandeira no país. O primeiro nascimento em cativeiro no mundo, com criação natural, ocorreu em 1976 no Dortmund Zôo, situado na Alemanha (Brandstaetter e Schappert, 2005).
Manejo e alimentação
Com o intuito de propiciar a reprodução, a FPZSP submete os animais a um manejo diferenciado, que vai desde a ambientação dos recintos até a alimentação oferecida. Eles são mantidos em recintos com piso de terra e vegetação arbustiva, sozinhos ou preferencialmente aos casais. Não é recomendado manter tamanduás-bandeira em grupos, pois pode haver interações agressivas entre eles (Superina et al., 2008). Os recintos possuem uma área mínima de 80 m² e uma lagoa rasa, e contam ainda com troncos e touceiras espalhados pelo ambiente e uma área de cambiamento (conforme anexo IV da Instrução Normativa nº 169/2008 do IBAMA, 2008).
Os tamanduás-bandeira são alimentados com uma dieta balanceada às necessidades da espécie, elaborada após um longo período de estudos e adaptação dos animais à cada item. A papa, oferecida no início da tarde, é composta atualmente por extrato de soja, ração de gato, ovo cozido, carne bovina moída, iogurte, mel, beterraba cozida, cenoura crua, banana, mamão e maçã. Uma vez por semana são oferecidos cupinzeiros inteiros, complementando a dieta e propiciando bem-estar aos indivíduos cativos através do enriquecimento ambiental.
Há poucos anos, a ração oferecida na papa era a de cachorro. Esta foi recentemente substituída por ração de gato, que contêm mais proteínas e também taurina, importante aminoácido que, entre outras funções, ajuda a manter a visão normal e previne cardiomiopatia (Aguilar et al., 2002). Esta substituição ocorreu de forma gradual e teve boa aceitação pelos animais.
Nascimentos
Do total de fêmeas cativas, sete reproduziram, somando 32 filhotes. A média foi de 4,6 animais por fêmea, variando de 2 a 10 ao longo de suas vidas. Em todos os casos nasceu apenas um filhote por gestação, sendo que a maioria dos nascimentos (59,4%) ocorreu no primeiro semestre do ano (Fig. 1). Nos meses de junho, novembro e dezembro houve ausência de nascimentos. Bartmann (1994) apud Patzl et al. (1998) afirma que ocorrem nascimentos da espécie ao longo do ano tanto em cativeiro quanto em vida livre.
Maturidade sexual
Dados sobre maturidade sexual foram analisados com as três fêmeas e os três machos reprodutores que nasceram em cativeiro (representando 42,7% do total de animais reprodutores de cada sexo). Uma das fêmeas criou pela primeira vez com 21 meses de idade e a outra com 54 meses. Os machos copularam efetivamente (gerando filhotes) com 24, 66 e 138 meses. Conforme Eisenberg e Redford (1999) e Nowak (1999) a maturidade sexual da espécie é atingida entre 30 e 48 meses de idade, porém três indivíduos se reproduziram com idade superior à reportada devido a problemas de pareamento, como incompatibilidade entre os animais e falta de parceiros. Em contrapartida, o intervalo mínimo entre os nascimentos citado por Eisenberg e Redford (1999) é de nove meses, porém três fêmeas deram à luz em menor intervalo de tempo, apenas sete meses.
Longevidade dos filhotes
Dos 32 tamanduás-bandeira nascidos na instituição, 17 completaram um mês de vida e 12 indivíduos ultrapassaram um ano. Destes, apenas seis reproduziram e oito estão vivos. Ainda não é possível analisar dados sobre a longevidade atingida em cativeiro, pois a expectativa de vida reportada em literatura é de 25 anos (Nowak, 1999) e o primeiro animal a nascer na instituição e a reproduzir completou 21 anos em 2007. Em Morford e Meyers (2003) há a ilustração de uma fêmea viva com 30 anos de idade, a idade mais longa já reportada. Neste mesmo trabalho, os autores indicam uma alta mortalidade infantil, com 46% dos óbitos até o sexto dia de vida e 31,25% nas primeiras 24 horas. Maia (2002) cita a taxa de mortalidade de tamanduás-bandeira nascidos em zoológicos do Brasil entre 1990 e 2000. Ele constatou que neste período houve 30 nascimentos, mas a mortalidade atingiu 47%. No presente trabalho foi evidenciada uma alta taxa de mortalidade infantil, com 36,4% dos óbitos ocorrendo nas primeiras 24 horas de vida dos animais.
Causa das mortes
Até junho de 2007, 24 filhotes de tamanduá-bandeira nascidos na FPZSP vieram a óbito. Destes, seis (25%) não tiveram a causa determinada, houve três (12,5%) casos de animais natimortos e dois (8,3%) encontravam-se em processo de autólise. Os outros indivíduos apresentaram algum dos problemas descritos a seguir (Fig. 2): problemas respiratórios (insuficiência respiratória, edema pulmonar ou pneumonia: 3; 12,5%), colapso cárdio-respiratório (3; 12,5%), traumatismo (3; 12,5%), choque hipovolêmico (2; 8,3%), inanição (1; 4,2%) e septicemia (1; 4,2%). Estes diagnósticos, além de outros como hepatite e endoparasitose, foram registrados por Miranda et al. (2004) como a causa da morte em 74 indivíduos da FPZSP entre 1964 e 2003.
Segundo Patzl et al. (1998) e Miranda et al. (2006a), as causas das mortes de tamanduás-bandeira em zoológicos estão relacionadas ao óbito fetal, comportamento maternal incorreto e injúrias dos machos adultos sobre os filhotes logo após o nascimento. Já Morford e Meyers (2003) observaram que as doenças respiratórias foram um dos problemas mais comuns apresentados pelos animais das instituições consultadas, sendo as fêmeas com idade inferior a dois anos as mais acometidas. Nas situações em que se registrou pneumonia, houve fatalidade em cerca de 60% dos casos.
Considerações finais
Os dados sobre maturidade sexual e intervalo entre nascimentos diferem dos citados em literatura, apontando um menor período para estes caracteres reprodutivos. Todas as medidas tomadas pela instituição visam aumentar as taxas de reprodução da espécie e de sobrevivência dos filhotes nascidos em cativeiro. Uma das medidas é a realização anual do exame clínico geral em todos os indivíduos preconizadas pelo Núcleo de Medicina Preventiva (NUPREV) da instituição (Miranda et al., 2006b). As outras medidas incluem intervenções no processo reprodutivo, como a separação do macho adulto da mãe após o nascimento da cria e a criação artificial dos filhotes em casos de necessidade, como quando a mãe tem falha de comportamento maternal. Com estas medidas, a FPZSP tornou–se uma das referências nacionais em criação e manutenção de tamanduás, contribuindo na conservação da espécie.
Agradecimentos:
A Kátia Cassaro, bióloga do Beto Carrero World, pela contribuição com dados que auxiliaram a elaboração deste trabalho.